Na verdade, como contei, é a mesma ideia que provoca aos sacristães madeirenses. Só que, para sermos mais exigentes, o subtexto que a suporta não era directamente esse.
Com efeito, a representação medieval de actos de higiene é que estava associada ao pecado da voluptuosidade e da soberba. Várias são as fontes que o sustentam, desde os banhos de Betsabé- mesmo debaixo do nariz de David, até aos cabelos soltos das filhas de Sião, fustigadas como luxuriosas por Isaías- apenas no que se refere a fontes religiosas.
Nas profanas, o tema é glosado com variantes que vão da simbologias das águas das regras das sereias e da Melusine, às lâmias bascas, senhoras das águas, na tradição da Catalunha ou os ritos das lavadeiras, de que já falámos a propósito das rosas das ursas.
Na tragicomédia La Celestina, Fernando Rojas leva ao extremo este sentido lúbrico, quando caracteriza a alcoviteira: « Ella ténia seus ofícios, conviene saber: lavadera, perfumera, maestra de hacer afeites y de hacer virgos, alcahueta y un poquito hechícera. Era el primer oficio cobertura de los otros, so color del cual muchas mozas destas servientas entraban en su casa a lavar-se »
Sem rodeios, Brueghel representou este acto de lavagem de cabelos femininos a par do homem a fazer a barba, numa das suas satíricas alegorias aos pecados mortais- neste caso, ilustrando a soberba.
Mas, para que não se pense que se preferiam tristezas a folias, naqueles tempos tão contrastados, voltaremos ao assunto.
Até já
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Ver: Isabel MATEO GÓMEZ, Temas profanos en la escultura gótica espagñola. Las sillerias de coro, Madrid, Instituto Diego Velazquez, 1979)