«(...)Não compete à Igreja tomar conta da saúde pública. Esse é o papel dos Estados, os quais são seculares - portanto, onde há separação de poderes entre o Estado e a Igreja. Se o Estado decidir, por exemplo, legalizar o aborto, a Igreja não tem forma de o impedir e terá de viver com essa lei. Assim, qualquer doença deve, em primeiro lugar e como direito dos cidadãos, ser alvo dos cuidados do Estado e seus instrumentos. Se, para além destes, ainda contarmos com o apoio da Igreja, óptimo. Mas lembra-te que tu não pagas impostos para que a Igreja tenha esse papel; é da sua iniciativa e a suas expensas.
-A Igreja é tão radical na defesa da vida que chega ao ponto de comprar guerras que parecem escandalosas aos que não são crentes, como a questão do aborto e dos contraceptivos - onde se inclui o nosso tópico do preservativo. Assim, tudo o que a Igreja faz tende a ser em nome da sua coerência face a esse propósito fundamental de proteger a vida.
- Na específica questão do combate à SIDA, como noutras áreas da assistência social, a Igreja é quem conhece melhor o terreno, pois mais de 25% dos cuidados mundiais prestados a doentes com SIDA estão a cargo de instituições católicas. Para além desta relação directa com a epidemia, a Igreja leva a cabo inúmeros programas de desenvolvimento e assistência de urgência aos mais necessitados, levando alimento, remédios, educação e informação. Tudo isto é combater a SIDA, salvando vidas e sendo infinitamente mais eficaz do que qualquer campanha imbecil que ninguém leva a sério, nem leva a que se mudem os comportamentos.
- O teu problema é até cruel na sua ironia. Tu achas que se a Igreja aprovasse as relações sexuais fora do matrimónio, e fora do amor (só porque existe desejo sexual, não importando que se reduza o outro ao seu corpo), ela estaria a combater a SIDA desde que recomendasse o uso do preservativo. Mas o mais certo seria que, assim, a Igreja estivesse a validar o problema que está na origem da SIDA: a promiscuidade.
Então, finalmente, os crentes poderiam dizer que a Igreja estava do lado daqueles que usam a sua sexualidade de forma egoísta e irresponsável, bastando apenas que se colocasse o preservativo para estar tudo bem perante Deus. Isto, como espero que reconheças com rapidez, não só transformaria a Igreja numa organização contraditória e inútil, como levaria ao aumento das relações sexuais de risco.
- Não se conhecem casos de indivíduos católicos que tenham invocado a doutrina para não usarem preservativo em relações sexuais de risco. O que se conhece é uma percentagem elevadíssima de indivíduos sem qualquer vínculo religioso, e cheios de informação sobre a doença, que se recusam a usar preservativo, ou que aceitam não o usar nos momentos da oportunidade. É isto que importa pensar.»
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