Hoje, 70.000 professores vêm a Lisboa protestar contra o Governo e a ministra da "Educação". Não posso simpatizar mais com eles. Mas não me parece que tenham percebido bem o fundo da questão: nem eles, nem a generalidade do público. Toda a gente parte do princípio que os professores devem ser avaliados; mesmo os próprios professores, que só criticam o método proposto pela 5 de Outubro. Ninguém ainda disse que os professores, pura e simplesmente, não devem ser avaliados, nem que a avaliação demonstra a (incurável?) deformidade do sistema de ensino. Em cada manifestação aparecem professores furiosos proclamando que não temem a avaliação. Acredito que sim.
Infelizmente, não se trata disso.
Uma avaliação pressupõe critérios: parece que neste caso à volta de catorze (e pressupõe avaliadores, muitos dos quais sem qualquer competência científica ou pedagógica ou interesses de uma total irrelevância para a matéria em juízo). Os critérios medem, peço desculpa pelo truísmo, o que é mensurável como, por exemplo, a assiduidade ou notas de uma exactidão discutível, como perfeitamente sabe quem alguma vez deu notas. Não medem nem a "moral", nem o "ambiente", nem os valores da escola ou a contribuição de cada professor para a sobrevivência e a força dessa "moral", desse "ambiente" e desses valores. Numa palavra, não medem a qualidade, de que depende, em última análise, o sucesso ou o fracasso do acto de ensinar. Criam uma trapalhada burocrática que esteriliza e que massacra e acaba sempre por promover a mediocridade, o oportunismo e a rotina. A sra. Thatcher ia matando assim a universidade inglesa.

Os professores não precisam de uma vigilância vexatória e nociva por "avaliações". Precisam de um ethos, que estabeleça uma noção clara e unívoca de excelência. Se o ensino superior for de facto excelente (e não o travesti que por aí vegeta) e se tiver inteira liberdade de seleccionar alunos (como agora não tem), os professores ficarão com um objectivo, o de preparar as crianças para o ensino superior, que os distinguirá entre si, sem regras de espécie alguma; e que tornará o seu trabalho pessoalmente mais compensador, interessante e útil. Desde o princípio que o Estado democrático não compreendeu esta evidência. Começou as reformas por baixo e não por cima. Aturou sem vergonha os mercenários que exploravam a universidade. E de repente quer que os professores paguem a conta do desastre.
Não é admissível.


Vasco Pulido Valente, Público de hoje

3 comentários:

Antónimo disse...

"Não posso simpatizar mais com eles. Mas não me parece que tenham percebido bem o fundo da questão": se isto não é a mais rematada evidencia de de que este gajo é uma besta (e digo-o no mau sentido), então os amaricanos bem podem tirar lá da Constituição deles as self-evidences que eu deixei de ter remota ideia do que são.

Quanto à avaliação dos professores, estou de acordo: não faz falta nenhuma. E o que não é dito também é muito importante: ofício mal pago não garante bons oficiais. Avaliar quer dizer pagar ainda pior à maioria (e só isso). Tirem-se as conclusões.

Beijocas, madrinha (há quanto tempo...).

zazie disse...

Quem é que é uma besta neste post?

ehehe

É que eu concordo com o VPV e a crítica que ele fez à burocracia da Tatcher é certeira.

1- Não pode existir avaliação nenhuma de nada de nada, e muito menos de qualidade de trabalho num sistema horizontal onde todos são pares e agora passavam os pares com mais um aninho de casa a preencher umas merdas burocráticas acerca de tretas dos colegas, juntando a família dos alunos para a festa.

E nisso o VPV tem absoluta razão.

Tens um debate anormal no Aspirina com aquele pafúncio de avatar a carica.

Beijocas, rapaz, ao tempo. Vou ver o que tens de novo no estaminé.

zazie disse...

Ah, e acho que ele tem razão quando diz que os profs muito provavelmente não percebem a questão quando dizem que querem ser avaliados mas de outra maneira.

Porque, de facto, neste sistema de pares, não há hipótese nem interesse nem vantagem nem nada de nada a avaliar. A única coisa que ainda poderiam pedir era para se acabar com a farsa das acções de formação em astrologia, viagens à Serra da Estrela, fotografia em máquina automática, medicinas alternativas, ponto-pé-de-flor e outras para profs de matemática, o filosofia ou Inglês, subirem de escalão.

Porque isso é o que existe e faz parte da mafia de exclusividade de negócio entre Escolas de Educação e ME ou sindicatos.

Quando o VPV diz que o mal vem da 5 de Outubro, também estou plenamente de acordo. Fora isso era despejar os pedagogos para rua e encerrar as escolas de educação.