«(...)recorde-se Lutero, por exemplo, esse "mais eloquente" e mais presunçoso camponês que a Alemanha já teve, assim como o tom luterano, que precisamente a ele agradava empregar em seus diálogos com Deus.
A oposição de Lutero aos santos intermediários da Igreja (em especial ao "porco do Diabo, o papa" [des TeujJels Saw den Bapst]) era em última análise, não há dúvida, a oposição de um grosseiro ao qual aborrecia a boa etiqueta da Igreja, aquela etiqueta reverencial do gosto hierático, que apenas aos iniciados e reticentes permite o acesso ao mais sagrado, protegendo-o dos grosseiros. Ali, entre todos os lugares, estes não deveriam tomar a palavra - mas Lutero, o camponês, queria as coisas de outro modo, aquilo não lhe parecia suficientemente alemão: ele queria sobretudo falar directamente, falar ele próprio, falar "informalmente" com o seu Deus... Bem, ele o fez. - O ideal ascético, já se percebe, não foi jamais e em lugar algum uma escola do bom gosto, menos ainda das boas maneiras - foi, no melhor dos casos, uma escola das maneiras hieráticas -: isto faz com que ele encerre em si algo radicalmente hostil a quaisquer boas maneiras - falta de medida, aversão à medida, ele é em si um "non plus ultra"[último limite]. »


Nietzsche, Genalogia da Moral

Burro-Papa (Geneve,1557)

Burro-Papa, encontrado nas águas do Tibre no ano de 1496, deu origem a uma série de gravuras que passaram a circular acompanhadas de uma legenda atribuída ao próprio Lutero:

"Corpo de mulher, de seios bem evidentes como símbolo de toda a raça de porcos epicuristas que só pensam em beber e comer e venderem-se a todo o tipo de lubricidades; cabeça de burro cheia de dogmas; mão direita semelhante a uma tromba de elefante, significando o poder espiritual do Papa com o qual atemoriza e exorciza as consciências por meio de falsas penitência; mão esquerda de homem, o seu poder civil que com a ajuda do diabo lhe confere o governo dos príncipes; pé direito de boi, significando a bajulação dos seus ministros; o esquerdo de grifo, os ministros do poder temporal e seus satélites; escamas de peixe nos braços e pernas e ventre e traseiro nu simbolizando a união dos poderosos que se unem ao papado mas que são desmascarados pela libertinagem no ventre nu que os desmascara, faz sair pela cauda o dragão da blasfémia".

4 comentários:

Henrique Dória disse...

O NIETZSCHE tinha destas.Onde estava a canalha mais rasca que a humanidade produziu ele via a etiqueta.Enfim, coisas de impotente...

zazie disse...

Leste o Nietzshe? sabes o que ele estava a caracterizar a este propósito?

O "ideal ascético" não te diz nada?

Henrique Dória disse...

E, no entanto, o Nietzsche tinha muito de ascético. Não era ele " o solitário de Engadine"?

zazie disse...

Para o caso...

Leste a Genealogia da Moral?