Mas é necessária uma causa!
Bouvard duvidava das causas. — Do facto de um fenómeno suceder a um fenómeno conclui-se que dele deriva.
Provem-mo!
— Mas o espectáculo do universo denota uma intenção, um plano!
— Porquê? O mal está tão perfeitamente organizado como o Bem. O verme que cresce na cabeça do carneiro e o faz morrer equivale como anatomia ao próprio carneiro. As monstruosidades ultrapassam as funções normais. O corpo humano podia ser mais bem constituído. Três quartos do globo são estéreis. A Lua, esse lampadário, nem sempre está visível! Julgas o Oceano destinado aos navios e a madeira das árvores ao aquecimento das nossas casas?
Pécouchet respondeu:
— No entanto, o estômago é feito para diferir, a perna para caminhar, o olho para ver, embora tenhamos dispepsias, fracturas e cataratas.


Gustave Flaubert, Bouvard e Pécouchet, ed. Cotovia, Lisboa, 1990.

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