“É de notar que neste tempo (1588) não faltavam sinais no céu e na terra com que claramente se entendiam os sucessos e os trabalhosos fins que haviam de suceder, nem faltavam Cassandras que como ela prognosticava por Tróia, o lastimoso fim desta empresa: dos sinais direi alguns notáveis e depois tornarei ao processo da Armada.
Primeiramente (...) apareceram sobre uma cidade muitos infinitos pássaros do mar pretos e brancos e tantos eram que cobriam a terra e não se via o sol. Com eles repartindo-se em dois esquadrões um dos pretos outro dos brancos e assim deram eles mesmo batalha e foram tantos os que caíram mortos que coalhavam a terra.
Na cidade chamada Mostranda nas partes do Norte para donde a Armada havia de ir apareceu tão grande cardume de peixes que cobria todo o mar e saindo os pescadores com as suas redes lançando-as para os tomarem sobre eles as tiraram todas cheias de sangue e somente numa delas veio um peixe (...)- e tinha as letras que nele verão de uma banda e da outra as quais letras eram de cor de ouro e tinha a cor de ouro e tinha coroa e depois de o peixe se lhe gastar a carne dele ficaram as letras matizadas na espinha de uma banda e da outra veio isto imprimido como digo ao cardeal Alberto o qual peixe é abaixo pintado.
De maneira que este é o peixe e letras que trazia de uma e outra parte escritas e não menos espanto fez outro sinal que neste meso tempo aconteceu no nosso Portugal que foi em Alentejo aparecerem uma manhã no ar dois pássaros nunca vistos nem conhecidos nem nomeados e tão grandes que metiam espanto e toda a manhã andaram peleijando no ar com tão grandes gritos e alaridos que acudiu a gente daqueles lugares a ver e acabando de peleijar caíram ambos no chão um deles morto e o outro vivo o qual o tomaram e trouxeram a Lisboa e o deram a D. Luís de Lencastre que o mandou meter numa grande gaiola de pau que para isso mandou fazer e que dois mariolas levavam quando o mandava mostrar a algumas fidalgas: era um pássaro não conhecido de ninguém tinha a cabeça muito grande o bico à maneira de papagaio o pescoço muito pardaço e pelado asas muito grandes em demasia que lhe cobriam o rabo umas pernas curtas mas muito grossas um acento do pé muito gordo e papudo umas unhas diabólicas e nunca houve homem por mais mundo que tivesse corrido que dissesse ter visto outro como este”
Pêro Roiz Soares, Memorial, códice da Biblioteca Nacional, publicado em 1953, pela Universidade de Coimbra.
Primeiramente (...) apareceram sobre uma cidade muitos infinitos pássaros do mar pretos e brancos e tantos eram que cobriam a terra e não se via o sol. Com eles repartindo-se em dois esquadrões um dos pretos outro dos brancos e assim deram eles mesmo batalha e foram tantos os que caíram mortos que coalhavam a terra.
Na cidade chamada Mostranda nas partes do Norte para donde a Armada havia de ir apareceu tão grande cardume de peixes que cobria todo o mar e saindo os pescadores com as suas redes lançando-as para os tomarem sobre eles as tiraram todas cheias de sangue e somente numa delas veio um peixe (...)- e tinha as letras que nele verão de uma banda e da outra as quais letras eram de cor de ouro e tinha a cor de ouro e tinha coroa e depois de o peixe se lhe gastar a carne dele ficaram as letras matizadas na espinha de uma banda e da outra veio isto imprimido como digo ao cardeal Alberto o qual peixe é abaixo pintado.
De maneira que este é o peixe e letras que trazia de uma e outra parte escritas e não menos espanto fez outro sinal que neste meso tempo aconteceu no nosso Portugal que foi em Alentejo aparecerem uma manhã no ar dois pássaros nunca vistos nem conhecidos nem nomeados e tão grandes que metiam espanto e toda a manhã andaram peleijando no ar com tão grandes gritos e alaridos que acudiu a gente daqueles lugares a ver e acabando de peleijar caíram ambos no chão um deles morto e o outro vivo o qual o tomaram e trouxeram a Lisboa e o deram a D. Luís de Lencastre que o mandou meter numa grande gaiola de pau que para isso mandou fazer e que dois mariolas levavam quando o mandava mostrar a algumas fidalgas: era um pássaro não conhecido de ninguém tinha a cabeça muito grande o bico à maneira de papagaio o pescoço muito pardaço e pelado asas muito grandes em demasia que lhe cobriam o rabo umas pernas curtas mas muito grossas um acento do pé muito gordo e papudo umas unhas diabólicas e nunca houve homem por mais mundo que tivesse corrido que dissesse ter visto outro como este”
Pêro Roiz Soares, Memorial, códice da Biblioteca Nacional, publicado em 1953, pela Universidade de Coimbra.